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Tanto a liberdade de um empreendimento independente quanto a solidez de um modelo já testado têm seus percalços

RIO – O negócio próprio entrou na lista de desejos do brasileiro. Seja para quem perdeu o emprego e não consegue se recolocar (o chamado empreendedorismo de necessidade), seja para quem busca caminhos profissionais com mais autonomia, o fato é que o desejo por empreender está em 2/3 dos brasileiros, de acordo com uma pesquisa realizada pela consultoria MindMiners, com a Paypal no ano passado. Também em 2017, de acordo com números do Indicador Serasa Experian de Nascimento de Empresas, 2.202.622 novas empresas foram constituídas, contra as 1.976.534 novas companhias criadas em 2016 — um aumento de 11,44%.

Para quem deseja seguir por esta árdua trilha, o caminho se abre em duas opções: a segurança da franquia ou a liberdade de um negócio inédito? A resposta é bem pessoal. Depende do valor a ser investido e do perfil do novo empresário.

— O principal conselho que dou ao futuro empreendedor é, acima de tudo, uma autoavaliação. Seja ela para franquia ou para negócio próprio. É analisar se há uma identificação com o tipo de negócio a ser investido. Nessa hora, honestidade com si mesmo é tudo, pois muito mais do que poder aquisitivo para iniciar o negócio, é preciso afinidade e dedicação para mantê-lo — analisa Eliane Bernardino, presidente da Associação Brasileira de Franchising Seccional Rio.

Abrir uma franquia nem passou pela cabeça de Heitor Neto, um dos sócios do Êtta Bar. Com sua experiência como empregado gerindo estoques, negociando e comprando, ele não enxergou a necessidade de procurar um modelo “pré-moldado’”. Primeiro veio um restaurante no Centro. E, ano passado, o bar em Botafogo. Junto com sócios, ele optou por desenvolver e planejar todo o empreendimento com capital e diretriz próprias.

— A maior diferença que vejo é que a franquia, para o empreendedor de primeira viagem no setor, acaba sendo uma “segurança” no que diz respeito a um coaching para administração do negócio. Mas nunca foi uma opção para mim — diz ele.

Na opinião de André Luis Soares Pereira, diretor e fundador do Grupo Soares Pereira, se o futuro empresário acredita ter uma ideia de um negócio diferente do que já é oferecido pelo mercado, é hora de criar a sua própria marca.

— Mas se entende que não e/ou que ainda não está preparado para os desafios de empreender, o empresário pode ter mais segurança no investimento em franquia, que oferecerá um modelo de negócios já testado quanto à aceitação e lucratividade, realizando assim, além da compra de uma ideia, um negócio completo com todo o know-how e padronização já implementado anteriormente — sentencia ele.

O professor dos MBAs da FGV, Roberto Kanter, concorda.

— Uma pessoa que tem uma confecção já produz suas roupas e contatos com uma rede de fornecedores. Ou seja, não precisa ter uma franquia — exemplifica. — No entanto, se o interessado é de outra área, nunca trabalhou com determinado produto, é melhor optar por uma franquia, que já vai se envolver com um modelo de negócio comprovado.

Foi o que fez Rita de Cássia, franqueada do Não+Pelo do Flamengo. Ainda na faculdade de Letras na Uerj, ela pensava em empreender. Em 1996, abriu com o marido, Cláudio Tavares, um box em um centro de informática. Ao ver que o negócio entrava numa curva descendente, o casal procurou um segundo negócio para ela administrar enquanto ele ficava na área dos computadores. Foram a uma feira de franquias e encontraram a empresa de depilação indolor, que estava chegando no Rio.

— Já vivi os dois lados. Acredito que a grande vantagem da franquia é a troca de experiências entre os franqueados. Esta troca faz a seu negócio crescer mais rapidamente — afirma ela, que abriu a filial há seis anos.

Em relação aos custos, o consultor e fundador da GPME — Expansão e Estruturação de Negócio, Pedro Horta, lembra que um negócio inovador não tem despesas cobradas na operação de franquia (royalties, taxa de publicidade e taxa de franquia) mas, em contrapartida, para obter sucesso, exige um valor intangível, “incomprável” e muito mais custoso: a alma do empreendedor. No entanto, esta não deve ser a única variável a ser levada em conta no momento da escolha.

— Um grande problema do modelo de franquia é que ele acaba atraindo investidores que buscam a simples diversificação de capital. No imaginário dos mesmos, a franquia funcionaria como uma aplicação financeira ou um simples modelo de rentabilidade. Só que a franquia não é uma previdência ou aposentaria, mas um meio de trabalho. O mercado é dinâmico, não há formas de sucesso e o que foi muito rentável outrora pode não funcionar da mesma forma hoje — relembra ele.

O empresário Luiz Felipe Costa, do Grupo Alento — que inclui as redes Billy The Grill, Naa! e Vizinhando — tem uma história curiosa no empreendedorismo. Em 2009, ele queria abrir uma empresa e acabou escolhendo uma franquia no ramo de alimentação “por ser o setor que menos sofre na crise”. Não deu certo e ele amargou um prejuízo enorme.

— A franqueadora não dava assistência. Disse que o investimento era de R$ 250 mil e acabou sendo muito mais. Resolvemos romper o contrato, o que gerou um processo judicial. Com esta experiência, resolvemos abrir a nossa própria marca em 2011, o que deu certo — relembra ele, que considera que a experiência malsucedida de ser franqueado acabou sendo fundamental para que ele, agora, seja um bom franqueador.

Vivendo os dois lados, Luiz acredita que há alguns caminhos para minimizar riscos tanto em franquias como em negócios independentes: planejamento, ter capital reserva e e procurar ajuda externa, tanto do Sebrae quanto de consultores do mercado ou de entidades como a ABF, por exemplo.

— É preciso planejar muito para reduzir o máximo os riscos. O negócio não dará grana no início e o empresário tem que se manter em pé sem aportar. E, neste processo, muitos quebram (tanto franquia como negócio próprio) por falta de capital — aconselha ele.

Com a verba da rescisão após 11 anos como gerente administrativa de uma empresa e “muita fé”, Viviani Lima está às vésperas de abrir, em Campo Grande, uma filial da Makevator, rede de formação e aperfeiçoamento de profissionais do segmento da beleza. Desde sempre, ela teve a inquietude de empreender, mas não sabia se seria algo inédito ou uma apenas uma franquia.

— Minha irmã tem uma loja da mesma empresa, e isto me motivou a me decidir por uma franquia. Para quem não tem muito capital para investir, se jogar em um negócio independente é complicado, pois é preciso engajar aquela nova marca no mercado. É só você e seu investimento. Já na franquia o nome já está consolidado — opina ela, lembrando que o fato de a empresa ser aberta à opinião dos franqueados fez com que ela fechasse com a Makevator.

— Se fosse negócio engessado, iria procurar outra franquia. O que pesou mesmo foi o relacionamento.
Matéria Publicada pelo O Globo em 01/04/2018 – Direitos Reservados

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